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02/04/2025Sua empresa é transparente? Você sabe o que realmente é transparência?
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Transparência pode salvar um negócio!
Ou pode enterrá-lo de pouco em pouco até não haver mais volta. E isso não é percebido de imediato.
Fala-se muito sobre isso – especialmente no âmbito da governança corporativa –, mas não é exatamente um assunto transparente para pequenas e médias empresas, para quem transparência não é apenas uma vantagem competitiva: é uma necessidade para sobreviver e crescer em mercados cada vez mais exigentes.
Segundo a ABNT PR 2030 e de acordo com o Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC:
transparência é um princípio e pilar básicos de governança que “consistem no desejo de disponibilizar para as partes interessadas as informações que sejam de seu interesse, e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. Não pode se restringir ao desempenho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores (inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que conduzem à preservação e à otimização do valor da organização”.
Transparência pode ser entendida como “característica de quem age de modo franco e sem subterfúgios” (Michaelis), condiz com dizer a verdade, relaciona-se a condutas éticas. Porém a realidade vai além de compartilhar informações: é sobre construir um ambiente de confiança para que decisões sejam entendidas e, esperançosamente, apoiadas por todos os envolvidos.
Transparência gera apoio, gera lealdade, gera consistência.
E não é como se fosse algo difícil ou complexo: muitas vezes, a dificuldade e a complexidade estão na decisão de ser transparente ou não, i.e., é uma questão de atitude, de prática.
Em regra, ser ou não ser transparente é uma escolha. E são muitas as razões para não ser transparente:
– Medo de expor vulnerabilidades e fraquezas (como problemas financeiros, falhas operacionais ou riscos legais) devido a possíveis reações negativas;
– Desconfiança de colaboradores usarem informações contra a empresa, seja por suspeitas plausíveis, seja por cisma e paranoia – muitas vezes, por um histórico de crises e inseguranças, uma cultura de segredos com base na ideia de que “menos informações vazadas significa menos riscos”;
– Desconhecimento dos benefícios da transparência;
– Desconhecimento de dados a serem compartilhados e informados, devido a uma má gestão ou devido à falta de infraestrutura ou de procedimentos ou de medições e monitoramento ou de tecnologia;
– Prática comum e antiga na empresa, uma cultura que se perpetua, especialmente por lideranças com muito ego e orgulho que gostam de tentar controlar tudo, concentrar informações e manter qualquer sombra de poder;
– Ambiente corrupto de negócios, em que se busca vantagem a qualquer custo.
E diversas outras mais… ou pode ser uma combinação de condições culturais, estruturais e econômicas. A questão é que todas elas conduzem ao fracasso do negócio.
Você sabe se sua empresa é transparente? Eis 9 exemplos de falta de transparência:
- Demitir pessoal sem explicar: despedir ou substituir um funcionário-chave e não explicar os motivos, tanto para esse funcionário quanto para os que permanecem na empresa.
- Ocultar remuneração de pessoal de alto escalão: planos de cargos / carreira apenas para a base da pirâmide salarial, especialmente se a remuneração dos executivos for disfarçada como dividendos ou outros pagamentos não tributáveis.
- Conduzir processos seletivos falsos: realizar entrevistas para cargos cujos candidatos já foram escolhidos previamente.
- Não fornecer feedback para os funcionários: não é apenas não dar um retorno sobre o desempenho dos funcionários, mas também fazer uma avaliação vaga, subjetiva, enviesada e incompleta.
- Esconder dificuldades financeiras: não compartilhar ou falsificar informações sobre resultados negativos, dívidas, rescisões contratuais, déficits com a equipe ou com investidores.
- Não alertar perigos e esperar que passem desapercebidos: não comunicar problemas de segurança ou falha em um produto, não fazer recall, não suspender a produção de um artigo defeituoso.
- Cometer sonegação fiscal: uso de caixa dois, subdeclaração de receitas, inclusão de funcionários como sócios (de fachada), falsificação de documentos fiscais, alteração de livros contábeis, emissão de notas frias, não recolher tributos… a lista é longa.
- Manipular relatórios: alterar dados para mascarar uma performance ruim em relatórios (ambientais, contábeis, financeiros, de desempenho, etc.) para cumprir exigências regulatórias.
- Mudar a prioridade de projetos sem justificar: suspender um projeto, retirar recursos dele ou mesmo cancelar sem informar claramente os motivos.
Falta de transparência gera desconfiança, desmotivação, boatos, distrações, decisões equivocadas, aumenta stress e ansiedade, prejudica o desempenho de equipes, provoca evasão de investidores, impede acordos com empresas estrangeiras, impossibilita empréstimos com bancos e financeiras, assusta clientes, piora crises de reputação e inúmeros prejuízos nessa linha. E, muitas vezes, é crime!
Quer exemplos do que falta de transparência faz?
- a) O escândalo da Enron, em 2001, com relatório de desempenho anual falsificado que fez as ações da empresa caírem de 90,56 dólares para menos de 1;
- b) o colapso e a falência do banco Lehman Brothers em 2008, que mascarou riscos da sua falta de capital para compensar empréstimos para os títulos de hipoteca subprime;
- c) a explosão da plataforma de petróleo Deepwater Horizon da Transocean, sob operação da BP, em 2010, após anos de negligências na gestão de riscos de segurança; afundou depois de 2 dias em chamas, matou 11 trabalhadores, deixou 17 feridos, derramou quase 5 milhões de barris de óleo no oceano, matou milhões de peixes, aves, tartarugas e mamíferos aquáticos e se tornou um dos maiores crimes;
- d) o uso de dados pessoais sem consentimento explícito dos usuários do Facebook em 2018, que levou seu presidente, Mark Zuckerberg, a depor perante o congresso americano e fez despencar as ações da Meta;
- e) as acusações de greenwashing contra Volkswagen (2015, o escândalo Dieselgate das emissões atmosféricas de veículos, que fez as ações da empresa caírem 1/3 em menos de 2 semanas e ensejou multas bilionárias), Coca-Cola (2020, posicionava-se como líder em sustentabilidade, mas foi denunciada como a maior poluidora de plásticos do mundo, seguida pela Nestlé e pela Pepsico) e Starbucks (2018, introduziu tampas de plástico sem canudos para reduzir o uso de plástico, mas que continham mais plástico do que as anteriores);
- f) a nossa Petrobras e todo o escândalo exposto pela Lava Jato.
Esses exemplos são grandes, mas os princípios se aplicam a qualquer empresa, independentemente de tamanho, porte, natureza ou atividade.
Ações de transparência podem evitar consequências como essas. Aqui estão 9 condutas práticas para implementar transparência e fortalecer a governança na empresa:
- Cumprir a legislação. Muito de ser transparente é apenas atender o que é já obrigatório do ponto de vista jurídico: informar passivos ambientais para órgãos públicos e comunidades afetadas, realizar licitações de forma idônea, prestar contas para agentes governamentais quando solicitado, elaborar relatórios com o conteúdo previsto em lei… a lista é tão extensa que obedecer ao ordenamento jurídico é praticamente um atestado de transparência.
- Compartilhar informações críticas com clareza. Se há uma mudança de liderança, desafios financeiros ou qualquer decisão estratégica importante – inclusive algo que afeta a comunidade local, tal qual aumento de poluição ou de tráfego veicular –, comunicar abertamente evita que boatos se espalhem. Um comunicado rápido e direto preserva a confiança e mantém o foco da equipe.
- Criar um canal de comunicação seguro e acessível. Permitir que os funcionários reportem preocupações ou sugestões em um ambiente protegido é uma medida que fortalece a confiança. Um canal de denúncias pode ser tão simples quanto um e-mail dedicado ou uma plataforma anônima, acessível a todos. Mas precisa de um tempo de resposta adequado também.
- Definir processos de seleção e promoção que sejam visíveis e justos. Quando as regras são claras e os critérios de promoção ou contratação são objetivos, todos na empresa sabem que o crescimento é possível e baseado em mérito, não em favoritismo. Um processo transparente evita sentimentos de injustiça e promove engajamento.
- Apresentar regularmente as métricas de desempenho. Em vez de manter dados operacionais e financeiros apenas com a alta gestão, compartilhar resultados com toda a equipe (numa frequência condizente com os indicadores monitorados) faz com que todos entendam como o trabalho coletivo impacta o negócio. Isso incentiva o alinhamento em torno de objetivos e metas.
- Dar explicações detalhadas sobre mudanças estratégicas. Se uma linha de produto será descontinuada ou se um novo mercado será explorado, não deixe a equipe às escuras. Detalhar os motivos dessas decisões ajuda os funcionários a entenderem a lógica por trás das mudanças, diminui sua resistência e aumenta sua colaboração.
- Envolver os colaboradores em pequenas decisões. Pedir opiniões da equipe em decisões menores, como a mudança de layout do escritório ou a escolha de fornecedores, cria um senso de pertencimento. Isso pode ser feito via enquetes rápidas ou reuniões informais. Quando todos têm voz, o engajamento aumenta.
- Reconhecer erros e informar os planos de ação. Admitir falhas e explicar o que será feito para corrigir o curso constrói credibilidade. Se um projeto não foi bem-sucedido ou se uma meta não foi atingida, ser honesto com a equipe e demonstrar o plano de ação para reverter a situação fortalece a confiança.
- Medir a transparência da e na organização. Ações que podem ser adotadas em pequenas e médias empresas são (I) fazer pesquisas de satisfação e (II) realizar pequenas auditorias internas (terceirizadas e independentes) para fazer uma revisão das práticas de comunicação, governança e abertura da organização; daí se pode evoluir para (III) criar indicadores (KPIs) de transparência e transformar as pesquisas de satisfação em (IV) “surveys de percepção” (pesquisas internas e externas com stakeholders para avaliar a percepção sobre a abertura e a comunicação da empresa), a fim de alimentar algum tipo de (V) índice de percepção de transparência; com mais maturidade e experiência, pode-se (VI) seguir modelos conhecidos de relatórios (frameworks tipo GRI e SASB) e (VII) comparar a empresa com outras (benchmarking). Isso faz parte da rotina de grandes empresas já acostumadas com compliance e accountability.
Lembre-se que transparência é também ser inteligível, é usar uma linguagem clara e acessível, comunicar de maneira simples, sem jargões técnicos e complexidades desnecessárias.
Empresas que praticam transparência constroem um ambiente de confiança mútua e comprometimento, com resultados que vão além de qualquer relatório financeiro.
A falta de clareza e comunicação aberta já impactou negativamente a sua equipe ou empresa?
Kesley Barbosa
24.09.2024